domingo, 31 de maio de 2020

o martelo

tenho tentado fazer como você falou,
como todo mundo faz, me reerguer
e tentar de novo,
mas não consigo e Deus sabe o quanto
tenho tentado;
rezei a todos os deuses para que eles
tirassem você do meu coração
e eles riram, os filhos da puta riram;
esses deuses sádicos de merda,
com o sorriso igual o seu, seus cabelos,
olhos e boceta;
e todo vez que eu tento me levantar
desce o seu martelo,
batendo e batendo, toda maldita vez;
"no chão, filho da puta, no chão",
ele diz e você ri,
toda maldita vez;
e manda mensagem, me liga, aparece aqui
e goza,
uma, duas, três vezes e parte pro próximo;
e desce o martelo,
batendo e batendo;
e eu vou ao chão,
toda maldita vez e espero a batida,
espero e espero;
esperando o telefone tocar,
a porta bater e o martelo descer,
toda
maldita
vez.

domingo, 24 de maio de 2020

tudo bem

indo pra dentro, reduzindo,
desaparecendo;
sem nada a dizer, só indo para baixo,
descendo;
o fogo se apagou, eu o perdi,
ou aprendi a desistir;
sem a fagulha, sem a violência
que me permitia continuar,
sem o ódio que me permitia amar;
só arrependimento, vergonha
e uma consciência pesada,
demasiado humana;
talvez estivesse errado sobre tudo
e ódio e amor não caminhem juntos,
nem uma relação se torne bonita
com o tempo;
talvez aquilo que perdure seja
o ódio
e ele seja o oposto do amor;
sim, o amor é mais bonito no começo,
quando é simples e natural,
e a insistência o torne feio;
acho que ela estava certa em desistir,
só percebeu antes de mim
que o ódio disfarçado de amor
é tudo o que restou;
e tudo bem,  não há nada a dizer.

domingo, 10 de maio de 2020

relógios impossivelmente grandes

não tenho mais tempo a perder,
o futuro se apresenta imenso para mim,
inescrutável.
mais do que nunca cada dia importa,
cada ato, cada pensamento.
perdi muito tempo, não sei mais
quanto tenho.
sempre me pareceu que faltava pouco,
então não me preocupava com ele;
estava próximo, porém inalcançável.
um não futuro, um não tempo
que estaria sempre a minha disposição,
sem nunca fazer parte dele.
mas o tempo finda, as pessoas findam,
as pessoas vivem e morrem,
e eu continuo aqui;
à parte do tempo, preso no tempo.
relógios impossivelmente grandes,
batendo, um dia mais e um dia a menos;
nenhum dia, todos os dias.
ontem, hoje e para sempre
eu vivi,
vivo,
viverei.